É um achado tão inusitado quanto significativo: cosmonautas russos parecem ter encontrado plâncton marinho vivendo em pleno espaço, a mais de 300 km de altitude, sobre a superfície externa da Estação Espacial Internacional (ISS). A descoberta, pasme, foi feita graças a uma faxina.
Oleg Artemyev e Alexander Skvortsov concluíram uma caminhada espacial de
rotina no último dia 18, que promoveu, entre outras tarefas, o
lançamento de um nanossatélite peruano (o cosmonauta literalmente
arremessa o satélite em órbita, como se pode ver abaixo). Uma das
atividades menos glamurosas da atividade extra-veicular foi a de limpar
por fora as janelas — chamadas também de iluminadores — do lado russo do
complexo.
Segundo os russos, esse é um procedimento comum e necessário em voos de
longa duração. Mas, de um ano para cá, eles decidiram analisar que
sujeira era essa. Algumas amostras (recolhidas em 2013) foram levadas ao
solo e estudadas em laboratório. Foi o que revelou a presença de
células de plâncton marinho do lado de fora da estação. As novas
amostras colhidas agora por Artemyev e Skvortsov devem passar pelo mesmo
procedimento em breve.
“Os resultados do experimento são absolutamente únicos. Encontramos
traços de plâncton marinho e de partículas microscópicas na superfície
dos iluminadores. Isso precisa ser mais estudado”, afirmou Vladimir
Solovyev, gerente russo da ISS, em nota da agência ITAR-TASS.
Os pesquisadores dizem que a contaminação não deve ter acontecido no
lançamento dos módulos, que partiram de Baikonur, no Cazaquistão, onde
supostamente não costumam viver plânctons marinhos, e também afirmaram
que as criaturas unicelulares conseguiram sobreviver após longos
períodos de exposição ao vácuo espacial. De onde elas vieram?
O mais provável é que elas tenham vindo mesmo da superfície do mar logo
abaixo — nada de ETs por hoje. Mas estamos falando de uma viagem a mais
de 300 km de altitude, onde a atmosfera terrestre é praticamente nula
(embora ainda dê alguns sinais de sua existência ao, por exemplo,
produzir arrasto sobre a estação espacial, puxando-a lentamente para
baixo e exigindo reajustes periódicos de órbita). Desnecessário dizer
que, até agora, ninguém imaginava que isso fosse possível.
UMA PITADA DE SAL
A notícia pegou de surpresa a comunidade científica mundial. O astrobiólogo americano David Grinspoon, ao comentar o achado, expressou suas dúvidas. “Estamos céticos, mas queremos ouvir mais a respeito”, disse.
A notícia pegou de surpresa a comunidade científica mundial. O astrobiólogo americano David Grinspoon, ao comentar o achado, expressou suas dúvidas. “Estamos céticos, mas queremos ouvir mais a respeito”, disse.
Claro, caso seja mesmo confirmada, essa descoberta é extraordinária.
Podemos dela concluir que a Terra é “contagiosa”, ou seja, é tão rica em
formas de vida que é capaz de despachar algumas delas até mesmo para o
espaço. Um asteroide de passagem poderia capturá-las e levá-las a outras
partes do Sistema Solar? A noção reforça a hipótese da panspermia,
segundo a qual organismos biológicos podem viajar de um planeta a outro e
se espalhar por diversos mundos. (Falo bastante dessa perspectiva de
que a vida talvez não seja um fenômeno localizado, mas um processo que
pode envolver múltiplos planetas, no meu novo livro, “Extraterrestres: Onde eles estão e como a ciência tenta encontrá-los”.)
Contudo, como lembra Grinspoon, ainda é muito cedo para tirar
conclusões. Por ora, esse é só um achado preliminar feito de forma quase
acidental. Merece um experimento controlado e mais cuidadoso, assim
como análises mais concretas. Felizmente, a Estação Espacial
Internacional está lá para isso.
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